Da FOLHA

Por ALVARO COSTA E SILVA

Cindido, o futebol carioca terá de se reinventar, para não morrer

O mais estranho Estadual dos últimos tempos teve um desfecho à altura: Flamengo e Fluminense duelaram três vezes, no Maracanã em silêncio, até que o primeiro conseguiu sagrar-se campeão do Ano do Corona. A vitória maior, contudo, foi alcançada fora dos gramados. Os cartolas enfim realizaram um velho sonho: banir das arquibancadas o torcedor —essa gentinha que só sabe atrapalhar o espetáculo. Viva a realidade paralela das transmissões por streaming. Uma novidade que, além de chique, moderna e limpinha, vai render aquela grana.

O plano começou quando os presidentes do Flamengo e do Vasco se aliaram a Bolsonaro, que no momento mais crítico da pandemia exigia a volta dos jogos. Com o apoio do prefeito Marcelo Crivella e da Ferj, assim foi feito. Continuar o Estadual era mais importante do que os Jogos Olímpicos, adiados para 2021.

O que menos importava na jogada era o torcedor, e menos ainda os pacientes que morreram no hospital de campanha instalado ao lado do estádio no período em que os jogos foram realizados. Por trás do alinhamento da cartolagem ao bolsonarismo, estava a MP 984, assinada pelo presidente em junho, que dá ao time mandante a prerrogativa de comercializar os direitos de transmissão.

A armação cindiu o já fragilizado futebol carioca: de um lado, Vasco e Flamengo; de outro, Botafogo e Fluminense, que protestaram contra a continuação do campeonato. Paulo Autuori, o técnico alvinegro, deu uma entrevista histórica, definindo a situação atual como “bandalheira” e chamando a federação de “grande mamata”.

O racha entre os quatro grandes lembra a crise com a implantação do profissionalismo, em 1933, quando os clubes se dividiram em duas ligas —o que poderá acontecer de novo.

O Campeonato Carioca hoje parece intubado, à beira da morte. Para sobreviver, terá de se reinventar. O primeiro passo: mandar a Ferj às favas.

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