Dirigentes não se atentam ao sistema de desporto nacional
Por Luiz Claudio Portinho Dias
A concessão de remuneração direta aos atletas no desporto não-profissional, fora de dúvidas, é uma transgressão aos sistema nacional do desporto e uma prática anti-ética. Ela dispensa o dirigente de obrigações tipificadas na legislação trabalhista, assim como das vinculações com o sistema previdenciário decorrentes. Mais, ela faz com que a agremiação burle as exigências traçadas na Lei 9615 para o desporto profissional, como é o caso do registro do contrato de trabalho, da submissão a exames clínicos e médicos dos atletas (artigo 34), a contratação de seguro acidente de trabalho (artigo 45) e da elaboração e publicação de demonstrações financeiras, após auditagem (artigo 46). E, com tudo isso, ela cria categorias diversas de agremiações dentro do “desporto amador”.
Do ponto de vista da relação entre agremiações, o acirramento do nível competitivo e o desejo de vencer acima de tudo desencadearam situações de aliciamento criticáveis. Dirigentes incompetentes na tarefa de criar canteiros em suas agremiações, buscam suprir tal deficiência através do aliciamento de atletas formados em outras agremiações, geralmente prometendo-lhe o pagamento de remunerações que, como se viu, desnaturam os elementos centrais do desporto não-profissional. E aqui cabe mencionar, pela primeira vez, o princípio da “diferenciação” plasmado no artigo 2º, inciso VI, de nossa Lei do Desporto, a estabelecer tratamento específico e finalidades diversas ao desporto profissional e ao desporto não-profissional.
Com tal agir, tais dirigentes afrontam a função social e pedagógica do desporto que, sem dúvida, encontra-se muito acima dos meros anseios particulares de “vitória acima de tudo”. Na Europa, cujos povos possuem nível cultural inquestionavelmente superior ao nosso, a declaração relativa ao desporto anexa ao Tratado de Amsterdã “salienta o significado social do desporto, em especial o seu papel na formação da identidade e na aproximação das pessoas”. Formar um atleta no desporto não-profissional é, antes de tudo, imbuí-lo de atitudes, valores e princípios éticos e morais que lhe possibilitem atuar na sociedade como cidadão; transformando-o em ator não só dentro das quadras e pistas, mas também no teatro da vida.
A corroborar ao que sustentamos, Rodrigo Ferreira da Costa e Silva, especialista em Direito Desportivo pela Escola Superior de Advocacia de São Paulo, anota que, “embora o atleta não-profissional seja livre para se transferir para qualquer clube sem dar satisfação ao seu formador (…) dirigentes devem ficar atentos ao aliciarem jogadores em formação por outros clubes porque a falta de ética neste aspecto pode manchar moralmente a administração e o clube em si”. E é exatamente por atuar num campo em que não há regulamentação específica, como é o caso da situação do atleta amador, que a ética se revela postulado de suma importância a distinguir o bom do mau dirigente.
Como reflexão sobre a ação humana, a ética no desporto não-profissional se torna cada dia mais importante à própria sobrevivência e cumprimento das finalidades da prática. Mas, como sintetiza o professor e filósofo Vanderlei de Barros Rosas, “ética é algo que todos precisam ter; alguns dizem que têm; poucos levam a sério e ninguém cumpre à risca”.
a falta de ética atrapalaha muitos brasileiros hoje