Da FOLHA
Por BRUNO BOGHOSSIAN
Cinco personagens da investigação ocupavam cargos ou viajaram às custas do governo
A tropa da muamba que negociou joias desviadas pelo governo Jair Bolsonaro atuou nos EUA com dinheiro dos cofres públicos. Pelo menos cinco personagens da investigação estavam no país a trabalho ou ocupavam cargos oferecidos pelo então presidente para acomodar aliados.
O general Mauro Lourena Cid, amigo de longa data de Bolsonaro, é o mais notório e bem remunerado do grupo. Até o final de 2022, o militar da reserva ocupava a chefia do escritório da Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos) em Miami. Seus vencimentos ultrapassavam R$ 60 mil por mês, segundo integrantes do órgão.
Segundo a investigação da Polícia Federal, o general recebeu US$ 68 mil dólares em sua conta bancária nos EUA em junho de 2022. O dinheiro se referia à venda de dois relógios que haviam sido dados como presentes a Bolsonaro, das marcas Rolex e Patek Philippe.
Naquela época, Mauro Lourena Cid ainda era o chefe do escritório da agência brasileira em Miami. O inquérito da PF indica que o general provavelmente sacava dinheiro da conta para repassar a Bolsonaro.
Filho do general, o coronel Mauro Barbosa Cid aparece nas investigações como operador das negociações. Naquele mês de junho de 2022, ele foi para os EUA num voo oficial com o presidente, na função de principal ajudante de ordens de Bolsonaro.
O coronel aproveitou a viagem de Bolsonaro a Los Angeles naquela data, paga com dinheiro público, para fazer negócios. De acordo com os documentos que embasaram a operação policial desta sexta-feira (11), ele fez um desvio no itinerário e voou até a Filadélfia, onde teria vendido os dois relógios.
Cid não recebeu diárias para integrar a comitiva de Bolsonaro, mas estava nos EUA como funcionário do governo, com salário na casa de R$ 26 mil.
O grupo recorreu a outros funcionários do governo enviados para os EUA a pedido de Bolsonaro ou como parte de sua equipe. No dia 1º de janeiro de 2023, Cid procura Marcela Magalhães Braga, que havia sido assessora da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e, depois, foi nomeada para o consulado do Brasil em Orlando.
Na conversa reproduzida no inquérito, Cid pede que ela envie “uma mala” de Orlando para Miami –um trajeto de cerca de 380 quilômetros. O coronel não informa o que estava guardado ali. Marcela sugere que o material seja levado, semanas depois, pelo cônsul-geral do Brasil em Orlando.
Cid, então, busca uma alternativa para fazer o transporte e, desta vez, aciona um aliado recém-demitido de um cargo dado a ele por Bolsonaro nos EUA: o médico Ricardo Camarinha. No governo passado, a Apex criou para ele uma função de consultor no escritório da agência em Miami. Ele ficou no cargo até o final de 2022.
Mais dois assessores de Bolsonaro se envolveram nas operações para negociar, transportar ou recuperar as joias em passagens pelos EUA enquanto recebiam dinheiro público.
O segundo-tenente Osmar Crivelatti foi designado por Cid para receber o relógio da marca Chopard que havia ido a leilão, sem sucesso, em Nova York.
Crivelatti estava na Flórida como parte da equipe deslocada para acompanhar Bolsonaro em sua estada nos EUA. De janeiro a março, o governo pagou R$ 112.939 em diárias para o segundo-tenente, além do salário.
Já o coronel Marcelo Câmara era o principal ponto de contato de Cid nas operações para recuperar as joias. Ele recebeu R$ 150.648,59 em diárias para acompanhar Bolsonaro nos EUA.