Da FOLHA

Por MARILIZ PEREIRA JORGE

Entidade posa de aliada da paz mundial enquanto repete parcerias com ditaduras

Em 2021, a mexicana Paola Schietekat saiu fugida do Qatar. Funcionária da empresa responsável por obras de estádios e infraestrutura da Copa 2022, a economista foi condenada na semana passada a sete anos de prisão e 100 chibatadas. O crime? Ter sido estuprada. Para a justiça do país ela é culpada por ter tido “relações sexuais extraconjugais”. Foi isso mesmo que você leu.

Não é exagero que a ONU considere o esporte como ferramenta para promoção da paz mundial. Cobri a Olimpíada no Rio e a Copa na Rússia e, muito mais do que a competição, os momentos de confraternização entre os povos são algumas das melhores lembranças que guardo. Nunca mais perderei um evento, pensei na época.

Como ir ao Qatar? O caso de Schietekat não é único. Em 2016, uma turista holandesa enfrentou a mesma situação. “Nossa preocupação é que, embora seja um país seguro, a Copa do Mundo —como em qualquer grande evento— inevitavelmente terá um aumento nos casos de violência sexual e o risco de mulheres, fãs de futebol de outros países, se tornarem vítimas duplas”, disse recentemente a pesquisadora da Human Rights Watch, Rothna Begum.

As catarianas são propriedade masculina. Pais, irmãos, tios e maridos decidem se elas podem estudar, viajar, dirigir, tirar passaporte ou casar. O governo tem negado que as leis sejam tão restritivas, mas na prática as mulheres ainda dependem dos homens para viver socialmente, mesmo que as regulamentações venham avançando.

Mas e a Fifa? A Fifa é uma graça. De vez em quando a entidade faz de conta que se importa com direitos humanos. Baniu corretamente a Rússia da Copa, posa de aliada da paz mundial, enquanto repete parcerias com ditaduras, faz vista grossa para trabalho escravo, para a falta de liberdades básicas de mulheres e da comunidade LGBTQIA+, para as prisões de críticos do país. Mas vai ter Copa.

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