Da FOLHA
Por HÉLIO SCHWARTSMAN
Desde que a abreviação do mandato tenha previsão legal, não vejo por que não usar o impeachment
A turma do deixa-disso alerta para o risco de banalização do impeachment. Nós, afinal, em apenas 35 anos de redemocratização, já afastamos dois presidentes por meio desse instituto. Os EUA, com uma história democrática de quase 250 anos, nunca chegaram a condenar um primeiro-mandatário pelos chamados “high crimes and misdemeanors”, que nós traduzimos como crimes de responsabilidade.
Não vejo esse perigo. A principal razão para isso é a maioria de 2/3 dos deputados necessária para autorizar a abertura do processo seguida da maioria de 2/3 dos senadores necessária para a condenação. Para dar uma ideia do poder de uma maioria de 2/3, basta lembrar que com uma proporção menor de parlamentares, 3/5, seria possível, por exemplo, transformar o Brasil numa monarquia.
Trocando em miúdos, não há nada de banal num governante que consegue mobilizar contra si 2/3 do Congresso. Na verdade, quando um dirigente não é mais capaz de convencer 1/3 dos parlamentares a salvar seu mandato ou apenas a ficar em casa no dia da votação (dá rigorosamente no mesmo), é porque seu governo já acabou faz algum tempo. O impeachment torna-se mais o reconhecimento de um fato político do que qualquer outra coisa.
Não sou o maior fã do filósofo Paul Virilio (1932-2018), mas acho que ele captou algo importante quando, já nos anos 70, identificou a velocidade e a aceleração (da vida, da política, das relações econômicas) como elementos definidores da modernidade —tendência que só se acentuou com o advento da internet.
A sociedade tem cada vez menos paciência para operar com os prazos fixos de resolução de conflitos políticos do regime presidencialista. Quando sente que um dirigente pisou muito fora da linha, prefere despachá-lo mais cedo para casa a esperar o próximo pleito. Desde que a abreviação do mandato tenha previsão legal, como ocorre no impeachment, não vejo por que não usá-lo.
Aiatohélio, o governador calça apertada, MBL (os psolkids) e quase toda imprensa estão inconformados porque com a vitória de Arthur Lira na Câmara a chance impeachment é zero. E mesmo quando a presidência era exercida pelo Rodrigo “nhonho” Maia se tivesse votos ele teria colocado pra andar um dos mais de 50 pedidos que estavam em sua gaveta. Os opositores vão ter de engolir Bolsonaro até 2022, enquanto isso vão ter de procurar novos “escândalos” como o do leite condensado pra desgastá-lo. Dado que a popularidade de Bolsonaro está na faixa de 40%, isso já lhe garante uma vaga no 2o turno nas eleições presidenciais em 2022, de fato, não tá fácil a vida do aiatohélio e da imprensa militante.