COF da Portuguesa rejeita proposta de venda da SAF a sócio de Ricardo Teixeira

Ricardo Teixeira e Wagner Abrahão

Por unanimidade, o COF da Portuguesa rejeitou a venda do futebol do clube a um consórcio liderado pelo grupo Águia, que tem Wagner Abrahão, sócio do Ricardo Teixeira, ex-presidente da CBF, como proprietário.

O Blog do Paulinho revelou a manobra em abril.

Através dela, além de dinheiro, o presidente da Lusa seria tornado CEO da SAF, perpetuando-se no poder.

Recentemente, Abrahão processou o Blog do Paulinho.

E perdeu.

Vale a pena conferir o revelador vídeo do julgamento, espécie de prévia do que ameaçaria o futuro da Portuguesa:


Nossa defesa, em desempenho brilhante do Dr. Diogo Flora, foi realizada pelo escritório Flora, Matheus e Mangabeira Sociedade de Advogados, sob patrocínio da ONG inglesa Media Defense.


Abaixo os trechos mais relevantes da sentença, verdadeira aula sobre Liberdade de Imprensa e de Expressão:

Trata-se de ação penal privada proposta por Wagner José Abrahão e Presc Viagens e Turismo Ltda. em face de do réu Paulo Cezar de Andrade Prado pela suposta prática do crime de difamação.

(…) a leitura da matéria publicada pelo demandado e dos textos destacados na inicial, faz concluir pela existência apenas de relatos e descrições genéricas de eventos envolvendo o querelante Wagner Abrahão, sem a determinação necessária para tipificação da conduta como difamação.

Veja-se:

As imputações supostamente difamatórias em relação ao primeiro querelante e atribuídas ao réu são:

  • (i) “Abrahão tem fama de dividir dinheiro com a cartolagem”;
  • (ii) “um personagem relevante do submundo da bola”;
  • (iii) “era assim, sob anonimato antes de ser notado por uma CPI, que o sujeito embolsava valores dos negócios da CBF. Trata-se de Wagner Abrahão, dono do grupo Águia, extremamente ligado a Ricardo Teixeira (…) a ponto de ter o nome citado, paralelamente, a um caso da morte de uma jovem”;
  • (iv) “Abrahão, segundo apontamentos de todas as CPIs que investigaram a CBF, além de livros que falam sobre a podridão do esporte e relatórios de Ministérios Públicos diversos, seria o recebedor informal (…) de dinheiro tratado como ilegal”;
  • (v) “dentre as acusações que pairam sobre Abrahão estão as de superfaturamento do preço de ingressos e ilegalidades em transações com pacotes de viagens”.

Por essa razão, a prática delitiva descrita na inicial, pertinente à vítima Wagner Abrahão, deve ser desclassificada para a figura de injúria, tipificada no art. 140 do Código Penal.

No mérito propriamente dito, a pretensão punitiva é improcedente.

No curso da instrução processual foram ouvidos os querelantes, assim como interrogado o acusado.

Wagner José Abrahão afirmou sobre o crivo do contraditório ter tomado conhecimento do texto por meio de terceiros que lhe perguntaram sobre os fatos alguns dias
depois da publicação. Não conhecia o réu e nem o blog dele. Já havia ouvido falar sobre o querelado. Se sentiu ofendido pela matéria.

“É muito desagradável quando se tem notícias desse tipo, pois isso gera nos parceiros de negócio uma dúvida que necessita explicação. Tal situação mancha uma história de mais de 40 anos de profissão. E é difícil explicar o que não se tem de fato”

“A empresa trabalha com futebol, com a logística de futebol. Tem um envolvimento diário com tudo aquilo que se relaciona com o futebol profissional. Tudo o que foi publicado é falso”

Teve problemas com parceiros comerciais em razão da matéria publicada pelo querelado.

Não se considera uma pessoa pública na área de futebol.

Possui reconhecimento por parte das pessoas que trabalham no futebol.

Não se recorda dos fatos constantes da matéria que lhe causaram constrangimento.

Não sabe dizer e não foi procurar se os fatos narrados estão na internet há muito tempo.

Tem conhecimento sobre o livro do qual foram retirados alguns fatos constantes da matéria. Não processou o autor do livro.

Tem conhecimento do relatório oficial da CPI do futebol, o documento não oficial feito pelo senador Romário não tem conhecimento.

Em interrogatório judicial o acusado exerceu seu direito constitucional em permanecer em silêncio (nota do blog: orientado pela defesa).

O delito de injúria, tipificado no art. 140 do Código Penal, requer para sua caracterização o dolo específico do agente, isto é, a especial intenção de ofender a honra subjetiva
da vítima.

O querelante Wagner José sentiu-se ofendido com as passagens do texto a seguir:

  • (i) “Abrahão tem fama de dividir dinheiro com a cartolagem”;
  • (ii) “um personagem relevante do submundo da bola”;
  • (iii) “era assim, sob anonimato antes de ser notado por uma CPI, que o sujeito embolsava valores dos negócios da CBF. Trata-se de Wagner Abrahão, dono do grupo
    Águia, extremamente ligado a Ricardo Teixeira (…) a ponto de ter o nome citado, paralelamente, a um caso da morte de uma jovem”;
  • (iv) “Abrahão, segundo apontamentos de todas as CPIs que investigaram a CBF, além de livros que falam sobre a podridão do esporte e relatórios de Ministérios Públicos diversos, seria o recebedor informal (…) de dinheiro tratado como ilegal”;
  • (v) “dentre as acusações que pairam sobre Abrahão estão as de superfaturamento do preço de ingressos e ilegalidades em transações com pacotes de viagens”.

Nesse cenário, verifica-se que há sim na matéria conteúdo que pode ser considerado ofensivo/violador a sua dignidade ou decoro.

Entretanto, deve-se perquirir sobre a intenção (dolo) do agente. E este somente pode ser apurado por meio da análise das circunstâncias do caso. Pois bem.

O demandado é jornalista, devidamente registrado e matriculado junto aos órgãos competentes.

No exercício de sua profissão, mantém desde 2006 um sítio eletrônico chamado “Blog do Paulinho”, voltado a acompanhar e divulgar informações jornalísticas esportivas.

Foi neste veículo de informação que se publicou a matéria tida por injuriosa pelos autores.

No curso da instrução processual apurou-se não terem a parte autora e ré qualquer relação entre si, não se conhecem e nunca haviam se encontrado pessoalmente e, conforme ventilado na peça acusatória, o site de notícias do acusado publica matérias abordando diversas personalidades.

A leitura integral do texto aponta ser a narrativa claramente voltada a fornecer informações tidas como relevantes para o público leitor do blog do réu, interessado em acompanhar os acontecimentos esportivos, inclusive em relação a notícias relacionadas àquilo que se ocorre nos meandros das organizações esportivas.

Conforme explanado na peça defensiva, que as informações divulgadas na matéria foram extraídas de outras fontes conhecidas.

Nesse cenário, constata-se a intenção do autor do texto de informar a seu público leitor notícias relevantes a este segmento social.

Muito embora o texto em análise se utilize de expressões e adjetivos negativos atribuídos ao querelante, assim como narrativa genérica o relacionando a negócios escusos e
criminosos, no contexto da crítica jornalística, pode-se ter seu uso como recurso retórico de eloquência.

Neste ponto, verifica-se trazer o caso aparente embate entre bens jurídicos tutelados constitucionalmente: de um lado o direito à livre manifestação do pensamento, opinião, crítica, manifestação constitucional da plenitude da liberdade de imprensa versus o direito à privacidade, intimidade, honra e imagem.

(…) o Supremo Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de conferir ao direito fundamental da liberdade de expressão posição de preferência dentre os demais direitos da personalidade, observados sempre os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, já que nenhum direito é absoluto.

As liberdades de expressão, opinião, manifestação do pensamento, coincidem com a liberdade de informação (direito de informar e direito de ser informado), realizado este por meio da liberdade de informação jornalística (art. 220 da Constituição Federal), dotada esta de verdadeira função social, na condição de instrumento de formação de opinião pública.

A relevância, preferência ou precedência, do bloco dos direitos que dão conteúdo à liberdade de imprensa1 acaba por impor maior escrutínio por parte do operador do direito a fim constatar a existência do dolo específico para a configuração dos crimes contra a honra, supostamente perpetrados no âmbito ou no exercício do direito à informação jornalística.

Acresça-se, a necessidade do exame minucioso da adequação típica do fato concreto ao tipo penal dos crimes contra a honra à luz do princípio da intervenção mínima do
direito penal, considerado este como a ultima ratio, já que a Constituição Federal assegura ao ofendido o direito de resposta e indenização.

Nesse curso de ideias, como já dito, as circunstâncias do caso afastam o elemento subjetivo necessário para a consunção da conduta imputada ao réu ao tipo penal descrito no art. 140 do Código Penal.

Com efeito, as expressões e a narrativa consideradas ofensivas ao querelante foram lançadas em matéria de cunho crítico-jornalístico, valendo-se de informações extraídas de outras fontes públicas, referentes ao querelante na condição de pessoa notável em virtude de atividade empresarial vinculada a clube esportivo de enorme reconhecimento popular, sem excessos que se transbordem a opinião jornalística.

Pelo exposto, (I) JULGO IMPROCEDENTE a pretensão punitiva para ABSOLVER o réu PAULO CEZAR DE ANDRADE PRADO da prática do delito tipificado no art. 140 do Código Penal, na forma descrita na queixa-crime, nos termos do art. 386, III, do Código de Processo Penal; e (II) EXTINGO A PUNIBILIDADE DO QUERELADO, em relação ao delito descrito no art. 139 do Código Penal, com fundamento no art. 107, VI, c.c. o art. 143, ambos do Código Penal.

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