De O GLOBO

Por JOAQUIM FERREIRA DOS SANTOS

Tem um sujeito na televisão que está prestes a ganhar um milhão e meio de reais porque fala baixo, usa palavras delicadas, aposta na necessidade de se escutar as mulheres e, como mantra de vida para os tempos modernos, ensina aos colegas do programa, um bando de cafajestes, que eles deveriam usar mais a palavra “desculpa”.

Eu posso estar errado, deve ser por isso que não passo de um cronista de segunda, mas se me dessem a edição do jornal eu mandaria parar as máquinas. Estamparia ao velho estilo uma manchete cheia de interjeições, como se o pequeno jornaleiro das antigas passasse pelas ruas gritando que o Brasil tem jeito:

“Extra! Extra! Surge novo nome para enfrentar Huck, Moro, Bolsonaro e Ciro em 2022!”.

O Brasil é um país cercado de grosserias por todos lados e é bom ter cuidado também com os carrinhos por trás. Eis que de onde menos se espera, ao redor da piscina do “Big Brother”, o ator negro desempregado Babu corrige com elegância o rumo da boçalidade. Não é por aí, ele parece dizer aos adversários, homens que ainda medem suas existências, o áudio da TV flagrou, pela centimetragem peniana.

“O feminismo não é o contrário do machismo”, diz Babu aos trogloditas, todos criados com mamadeiras de whey protein e zero carboidrato de letras. Eu aprendi que o machismo quer a supremacia, o feminismo quer a igualdade”.

Babu, pai de três filhos, o aluguel atrasado, podia estar mais interessado em botar fogo na casa e devolver no olho das câmeras o cuspe das injustiças. O apelido, por exemplo, é contração de um outro, o insuportavelmente racista “Babuíno” com que atravessou a infância.

Podia aproveitar a audiência para cerrar punhos e discursar inflamado contra o preconceito. Ainda não é aí que cai na armadilha: “Eu faço parte dos excluídos, dos afrodescendentes, favelado, mas mesmo assim eu tenho o privilégio de ser homem” – e é como se John Lennon cantasse ao fundo a balada, suave e dolorida, “Woman is the nigger of the world”.

Eu não sei o que eles fizeram na casa na noite passada, mas até o fechamento desta edição ninguém esperava por essa. Na contramão de todos os vitoriosos toscos em cartaz, quando a arrogância parece ser o mérito único para vencer a prova do líder, eis que surge a inesperada supremacia do homem sensato, um babuíno de bons modos jogado na jaula dos trogloditas tóxicos.

“Auto-suficiência é bom quando você vai bater um pênalti, em convívio social é outra coisa. A princípio, ninguém é melhor que ninguém”, diz Babu.

Os quartos, a sala, a cozinha e o quintal da casa transformaram-se num laboratório das novas relações entre os sexos, tudo depois que um grupo de homens combinou, como forma de vencer o jogo, estuprar a moral das mulheres – eles seduziriam as comprometidas, com namorados na vida real. Deu ruim – e a cada paredão um machão é catapultado para longe da casa.

“O homem sempre esteve na posição da autoridade”, diz Babu aos que ficaram e não se conformam com o desprezo delas ao tamanho de seus muques. “É hora de sair da posição de privilégio. Eu estou nesse processo de me educar”.

O Brasil não é para amadores, o Brasil é o país do faturo – o Brasil é uma caixinha de surpresas que se presta a multidões de frases de efeito. Babu é a volta do Brasil gentil. Na confusão atual de despropósitos, o reinado da ignorância e do impressionante, ele quer ganhar seu milhão e meio apostando em todas as conjugações do verbo educar. Acha bonito ser delicado. Não sei se isso dá boa crônica, mas finalmente temos uma manchete de esperança.

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