País de poucos

Por SÓCRATES

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Ainda se via o semblante esperançoso dos jovens; revelava força em seu olhar. A musculatura de seus braços e pernas demonstrava o fardo que carregava em seu dia-a-dia. Ainda assim, havia orgulho estampado em sua altiva figura, pois seus filhos, presentes, sempre proporcionaram inúmeras alegrias. Quase todos eram atletas que se destacavam em vários esportes durante todos esses anos e, apesar das eternas dificuldades econômicas, buscavam incansavelmente destaque em suas atividades. Este imenso país, que é o nosso, infelizmente sempre dependeu de individualidades para se destacar no cenário esportivo mundial. Com raríssimas exceções em segmentos um pouco mais bem organizados, como o voleibol, que, no entanto, também necessitou, e muito, de intenso intercâmbio com estruturas mais desenvolvidas para evoluir.

Há uma década, aproximadamente, tínhamos entre nossos grandes esportistas atletas como Maurício Lima, um excelente jogador de voleibol com estatura suficiente para ser titular da seleção universitária onde cursava o último ano de Educação Física, além de ter participado de uma Olimpíada no passado, tendo sido campeão e escolhido o melhor levantador do torneio.

Oscar Schmidt se destacava no basquetebol, passara os últimos anos no exterior rodando por terras européias sempre com muito sucesso. Posteriormente, assumiu inúmeros compromissos, inclusive políticos, reafirmando seu interesse em colaborar com a melhora da condição de seus colegas.

Roberto Scheidt vivia e até hoje vive no mar, pelo qual é apaixonado. O veleiro é sua casa, o vento, seu motor, e o horizonte, sua obra de arte. Aurélio Miguel era o mais forte e nem por isso o menos cortês, ganhava a vida em um tatame e só lhe falta a obliqüidade nos olhos. De luta em luta buscava seu caminho mesmo com aquele velho problema no ombro. Gustavo Borges era quase americano, havia se mandado para aquelas bandas por muito tempo para estudar e nadar. Quando criança parecia um peixe. Ali, lembrava um leão-marinho.

Guga Kuerten gostava mesmo de terra batida desde garoto, empunhando uma raquete buscava melhorar seu jogo. Em um esporte pouco praticado nas redondezas, era estranho que ele tivesse ido tão longe. João do Pulo, ao contrário, detestava a pista de terra em que era obrigado a treinar, mas com o tempo passou a competir em pisos exóticos que o levaram a grandes resultados.

Porém, a maioria gostava mesmo era de um esporte em que uma bola era a rainha. Praticavam dia e noite, como se o mundo fosse acabar no dia seguinte. Muitos puderam seguir o seu caminho no País, porém, alguns optaram por outras estradas, buscando, bem longe dali, a possibilidade de atingir seus sonhos. Deram-se bem, vivem com conforto, apesar da saudade de seus amigos e de seu povo. A Copa do Mundo permitiu à nação a proximidade com esses filhos errantes. Defenderam outras bandeiras, é certo, no entanto sentiram um orgulho especial em participar ativamente do desenvolvimento desses outros povos.

Nosso país também sempre soube retribuir com carinho as homenagens prestadas. Um pai, como este, que chora freqüentemente a ausência dos seus, sorria com imensa alegria ao ver o sucesso que muitos jogadores de futebol conquistaram longe de casa, não importando o resultado das competições. Eles foram vitoriosos, campeões e representaram a coragem, a persistência, a capacidade de adaptação de um povo que amava e ama a sua terra, mas que, quando necessário, sabe se tornar hóspede.

Hoje, o que vemos é muito semelhante àquela época. Infelizmente, nada mudou a não ser o grau de envolvimento e o grande investimento do Estado brasileiro. Sem resultados, no entanto. É que os recursos são administrados por quem não tem compromisso com o esporte nacional e, sim, com seus próprios interesses. Assim, nossas estruturas esportivas continuam caminhando como cegos errantes, sem saber para onde.

Os talentos individuais continuam a ser os protagonistas. César Cielo, como Gustavo Borges, passou os últimos anos no Norte do continente a um custo familiar incalculável. Maurren Maggi ficou abandonada à própria sorte, quando de seu estranho caso de doping, que quase a fez abandonar tudo. E assim por diante.

O esporte deste país altivo, orgulhoso, rico e esperançoso não pode ficar nas mãos de gestores do nível dos que possuímos. É muito pouco continuar dependendo de raros talentos que lutam contra absurdos obstáculos para alcançar seus sonhos. Queremos mais, muito mais. 

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