Sobre medos e medrosos

http://www.cartacapital.com.br/app/coluna.jsp?a=2&a2=5&i=5090

Por SÓCRATES

O futebol, apesar de ser um esporte muito particular, por permitir que o pior vença ou que um pequeno detalhe defina o vencedor, tem sua lógica. Essa coerência tem estreita relação com o comportamento das equipes litigantes. Sempre de acordo com o viés psicológico que pende ora para um lado, ora para o outro, proporcional que é à confiança que demonstra em determinado momento esta ou aquela equipe.

No jogo em Salvador, domingo, o Palmeiras começou muito mal, talvez pela sentida ausência de Diego Souza, seu melhor jogador, que, queiram ou não, dá equilíbrio e ritmo ao time. Com isso, o adversário tomou conta de todos os espaços que seu estádio permitia, tanto dentro quanto fora do campo de jogo, já que sua torcida era a única que se manifestava.

E facilmente chegou ao primeiro gol em mais uma falha de Marcos, o goleiro campeão do mundo em 2002, que depois de várias lesões e intervenções menos conservadoras, aparentemente ainda não se livrou por completo das dores nos punhos. Estruturas estas que parecem padecer ao extremo, o que explicaria em parte por que evita espalmar boa parte das bolas que são endereçadas ao gol que defende.

Ora, com seu principal atleta fora da equipe e sua maior referencia moral, histórica e afetiva falhando de forma inusitada, não foi nenhuma surpresa vermos o líder do campeonato se apequenar assustado e encolhido como cego em tiroteio e lagrimejando como recém-nascido.

Em casos como este, principalmente por estarem expostos à avaliação dos expectadores presentes (além dos milhares que os veem pela tevê mundo afora), os jogadores com menor capacidade de administrar a imensa responsabilidade de vestir uma malha tão tradicional se escondem nas próprias limitações, que, não tendo quem as proteja, transparecem por inteiro para desespero de seus portadores.

É nessas situações que percebemos quem é quem em um campo de futebol.

É muito fácil para algum jogador de futebol mediano atuar quando tudo rema a favor ou quando se está vencendo com facilidade um oponente qualquer.

Entretanto, são os mesmos que, se pudessem, evitariam estar em campo quando de uma derrota acachapante ou nos períodos de jejum prolongado de vitórias, muitas vezes inventando contusões e consequentemente ausências frequentes para permanecerem escondidinhos nas macas do departamento médico de seus clubes, medrosos que são.

Medrosos são também aqueles que, estando em cargos de comando e, portanto, possuidores do poder decisório, não tomam as necessárias atitudes quando estas envolvem atletas renomados por uma vasta trajetória de conquistas. Evitam assim produzir reações incontroláveis na opinião pública, que poderiam pôr em risco o próprio posto de trabalho.

Principalmente quando a razão dessa eventual posição a ser assumida é tratada como segredo de Estado. Com isso, estimulam a depreciação do produto que está sob sua responsabilidade somente para se preservar, abandonando o máximo objetivo que rege os esportes coletivos e a sociedade como um todo, que é o bem-estar geral.

Assim como medrosos são os que se escondem em pretensas capacitações, descascadas publicamente ao se arvorarem de ser os maiores, ou aqueles que explodem em violentas reações só por causa de uma insuspeita insegurança que os acompanha como um ombudsman irrefutável arrasando seus cérebros subdesenvolvidos e carentes de ego acarinhado.

Bem, já deu para perceber que o diagnóstico que dou como causa de uma derrota como esta em Salvador é puro medo. Sem exagero. É só lembrar do comportamento dos dois jogadores que deveriam assumir o cargo de líder em situação tão especial. Um errou quase tudo que tentou realizar e o outro nem sequer isso se dignou a fazer: escondeu-se.

Como é que uma equipe como esta pode pretender alcançar o topo do mundo do futebol? Difícil, não é? Sorte dos “verdes” que quase todos estão se comportando como tal. A tremedeira anda à solta neste Campeonato Brasileiro, o que pode abrir brecha para mais um título são-paulino, ou espaços imensos para um grupelho de pequenos times que podem se meter a besta e tentar beliscar o caneco.

No primeiro caso, um prêmio ao conhecimento e à boa educação de seu novo treinador. No segundo, uma lição bem brasileira de que, com talento, competência e oportunidade, pode-se chegar longe. Mais do que se possa imaginar.

Facebook Comments