Marcelo Campos Pinto (Globo), Andres Sanches e Ricardo Teixeira

De O GLOBO

Por MARTÍN FERNANDEZ

Modalidade no país seguirá pagando a conta

O esquema era simples, simplório até: empresários depositavam uma grana em contas pessoais de dirigentes, que então usavam seus poderes no clube para contratar jogadores ruins indicados por aqueles empresários. Aconteceu de forma recorrente entre 2015 e 2016 no Internacional, durante a gestão de Vitório Píffero, segundo documentos obtidos pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul publicados nesta sexta-feira pelo jornal “Correio do Povo”. Vai continuar acontecendo enquanto corrupção privada não for crime no Brasil. Dinheiro de clube (ou de confederação) é dinheiro de ninguém.

O único dirigente brasileiro preso por esse tipo de crime no futebol teve que ser detido na Suíça e condenado nos Estados Unidos. Foi quase comovente ver os advogados de José Maria Marin tentando convencer uma juíza no Tribunal Federal do Brooklyn a absolver o ex-presidente da CBF com o seguinte argumento: “Ele não sabia que isso era crime no país dele”.

Isso, no caso, era receber propina para beneficiar empresas de marketing esportivo em contratos. Exatamente como os ex-cartolas do Inter. Como o dinheiro recebido por Marin circulou por contas bancárias e empresas de fachada nos EUA, ele foi condenado a quatro anos de prisão e a devolver alguns dos milhões de dólares que havia embolsado em subornos.

Quando cartolas abusam de suas posições no futebol para enriquecer indevidamente, as consequências são nefastas. Recursos deixam de ir para onde deveriam, o mercado termina envenenado. No caso específico de um clube, pernas de pau vestem camisas que não merecem, os bons resultados não chegam, menos dinheiro deixa de entrar. É difícil sair do círculo vicioso: o Inter caiu em 2016.

Durante anos, a Fifa bloqueou US$ 100 milhões a que o Brasil teria direito por ter abrigado a Copa do Mundo de 2014. A entidade alegava que não poderia liberar o dinheiro enquanto o futebol brasileiro fosse comandado por investigados por corrupção. Os recursos seriam usados para a construção de Centros de Treinamento para categorias de base e times femininos nos Estados que não receberam jogos do Mundial.

Infelizmente, a investigação do Ministério Público do Rio Grande do Sul tende a terminar sem punidos. A inexistência de legislação sobre corrupção entre privados é um convite aos aproveitadores que historicamente cercam o futebol brasileiro.

Os controles internos dos clubes e das entidades que organizam o futebol são frouxos demais para impedir casos de corrupção e punir seus protagonistas. Foi preciso que o FBI e a IRS (a Receita Federal dos EUA) lançassem seus tentáculos sobre outros continentes para que um esquema criminoso fosse desmontado após décadas de operação.

Acusados dos mesmos crimes que levaram Marin para a cadeia nos EUA, Marco Polo Del Nero e Ricardo Teixeira tomaram o cuidado de nunca mais sair do Brasil. Numa entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, Teixeira deixou tudo bem claro: “Tem lugar mais seguro que o Brasil? […] Você sabe que tudo que me acusam no exterior não é crime no Brasil.”

Enquanto Teixeira tiver razão, o futebol continuará pagando.

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