Da FOLHA

Por MARILIZ PEREIRA JORGE

Em qualquer lugar do mundo minimamente decente, a prisão dos dirigentes da CBDA (Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos) deveria ter sido um escândalo. No entanto, pouca gente parece ter se chocado, talvez porque ninguém tenha ficado surpreso. Qual é a novidade, certo?

Perdemos a capacidade de nos indignar com as denúncias, com as prisões, com os montantes desviados. Por muito menos, os suecos tiveram uma semana movimentada na segunda quinzena de março porque um deputado usou verba pública para pagar oito viagens de trem de caráter pessoal, uma refeição, água, vinho e um pacote de amendoim. Total do delito: R$ 3.800. O político já devolveu o dinheiro, mas segue investigado.

Falamos de R$ 40 milhões, no caso da CBDA. É possível que pareça dinheiro para pagar amendoim, quando olhamos os bilhões recuperados pela Lava Jato. Mas isso representa cerca de um terço do investimento declarado pela entidade na preparação da natação brasileira para a Rio-2016, quando o Brasil deixou os Jogos sem nenhuma medalha, ªfaçanhaº que não acontecia desde a Olimpíada de Atenas, em 2004.

Foi o maior investimento da história da CBDA e agora sabemos que uma parte escandalosa desse dinheiro foi roubada, segundo o MPF (Ministério Público Federal). Mas não apenas a gatunagem dos dirigentes explica por que o desempenho dos atletas foi tão decepcionante.

Logo depois dos Jogos, Cesar Cielo, que ficou fora da Rio-2016, mas é três vezes medalhista olímpico, criticou a falta de projeto da entidade e também a forma como os investimentos na preparação da equipe de natação foram feitos. Era sabido que o Brasil seria sede desde 2009, o que aumenta a pressão por resultados, mas apenas em 2014 o dinheiro começou a aparecer, quando não havia mais muito o que fazer, segundo ele.

Ou seja, o problema vai além da corrupção, esbarra num velho conhecido, a falta de habilidade dos gestores. Casos assim deixam evidente que o esporte brasileiro é reflexo da nossa política, o retrato fiel da incompetência movida a fraude.

O ex-presidente da CBDA Coaracy Nunes, preso esta semana com mais dois dirigentes, já havia sido afastado em setembro do comando da entidade, acusado de fraudes em licitações e malversação de dinheiro público.

Em novembro, o desembargador Nery da Costa Júnior derrubou a liminar que determinava o afastamento.

Mas vejam só como são as coisas: em 2011, o tal desembargador foi alvo de investigação da Corregedoria do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) por venda de sentenças. O processo foi arquivado em 2015 pelo então presidente do CNJ Ricardo Lewandowski.

A única coisa que nos dá um pingo de esperança de que as coisas mudem é que tem gente que ainda se indigna, briga, peita a sujeirada. Foi lindo o desabafo da nadadora Joanna Maranhão, no Instagram: ªShot de repositor e jacuzzi pra comemorar a prisão da diretoria da CBDA pela polícia federal. Meu dedo coça pra marcar um certo treinador que disse que `não iria se posicionar, porque podia ser tudo uma manobra da oposição’ o senhor, treinador chefe, seus atletas e todos que corroboraram com fuga e silêncio, tem sua parcela de culpa, viu? Recado dado, justiça feita.º

Que seja feita. Antes tarde do que nunca.

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