Distintos cartolas

Da FOLHA

Por MARILIZ PEREIRA JORGE

Não há nada que faça o esporte andar mais na marcha a ré no Brasil do que a política. Tudo que tem essa ciência da governança do Estado envolvida tem cheiro rançoso, olhar para o passado, jogo de interesses sórdidos.

O exemplo mais recente de que nossos representantes são desconectados da realidade, do bom senso, da mudança de valores e só pensam em manter no cabresto seus próprios currais eleitorais foi a aprovação vexaminosa dos senadores de PEC (proposta de emenda constitucional) para derrubar a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que proíbe vaquejadas e rodeios.

No mundo inteiro, as atividades que envolvem animais, sejam elas esportivas, culturais ou de puro entretenimento, vêm sendo proibidas ou caindo em desuso porque ninguém precisa se divertir vendo elefante jogar bola, baleia pular num tanque, touro ser abatido ou vaqueiro derrubar boi.

O que os senadores fazem? Tentam passar por cima do STF, criando uma PEC que promete que os animais não serão maltratados. Puxar um boi pelo rabo e derrubá-lo no chão para puro deleite de uma plateia parece mau trato suficiente para que não seja permitido.

Pior, tentam colar nas pessoas que são contra esse pavoroso “patrimônio cultural” preconceito inexistente. “Pior que derrubar o boi é o preconceito contra a cultura do Nordeste”, disse o senador Roberto Muniz (PP-BA).

Ser contra uma prática violenta nada tem de preconceituoso, mas de civilizado. Ir na contramão de uma tendência mundial de não usar animais para fins como esse é apenas medida popularesca para agradar o eleitorado. Isso sim poderia ser chamado de voto de cabresto.

Esse mesmo Congresso que bate de frente com o STF para garantir a continuidade de uma barbárie é aquele que nada faz para moralizar outro esporte, esse, sim, um esporte de verdade, o futebol. A CPI que investiga corrupção da CBF e os dirigentes já indiciados nos EUA foi arquivada na Câmara e encerrou os trabalhos no Senado, em dezembro, sem nenhum indiciamento.

Aos olhos de nossos legisladores, a Justiça americana deve ser louca. Mas o que esperar de casas que têm entre seus integrantes políticos enrolados em contravenções, além de compadrio?

Tudo que envolve a política, seus compadres e seus interesses é assim. A ausência desses elementos pode explicar por que a “ciclovia mais bonita do mundo”, aquela que seria um dos melhores legados da Olimpíada, mas deixou como saldo dois mortos, continua fechada. Quem se interessa por aquele abacaxi, hoje? Nem o prefeito Marcelo Crivella e muito menos o seu maior entusiasta Eduardo Paes.

O trecho derrubado pelas ondas do mar foi reconstruído ainda antes dos Jogos, mas segue interditado pela Justiça. Apesar disso, pedestres e ciclistas têm utilizado o trecho, passando por cima dos blocos de concreto, colocados no lugar. É uma imbecilidade. Ao dar um jeitinho de usar a ciclovia dessa forma o usuário deixa de pressionar o poder público que não está nem um pouco preocupado em agilizar a perícia que atestaria a segurança do local.

Tudo que foi superfaturado, malfeito, abandonado, mergulhado em corrupção, no que se refere ao esporte brasileiro, tem o dedo podre da política. Não que eu seja pessimista, mas estamos perdidos.

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