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Da FOLHA

Por MARILIZ PEREIRA JORGE

Podemos julgar um homem pela forma como ele trata a sua mulher. E a postura de Donald Trump em relação a Melania deixa poucas dúvidas de que ele seja apenas um sujeito egoísta, mal-educado e autocentrado.

Não é preciso ser muito sensível para notar que, no dia da posse, a atitude de Trump ao desembarcar do carro e não esperar pela mulher para, juntos, irem ao encontro dos Obama, foi no mínimo inadequada. Não é preciso um protocolo específico para que homem ou mulher tratem quem quer que seja com atenção e cordialidade.

Li nas redes sociais desculpas para o comportamento desatencioso que tem sido visto desde que o casal Trump passou a estar sob a mira do público. “Ela estava deslumbrante.” “Não sabemos como é a relação na intimidade.” “Milhares de mulheres queriam estar no lugar dela.”

Nada disso é minimamente aceitável. Melania está sempre deslumbrante, é uma top model. Mas uma top model que, mesmo acostumada aos holofotes, ora parece uma garota assustada, com medo de dizer ou fazer algo errado e ser repreendida pelo pai, ora uma menina com cara de quem acabou de cair do caminhão de mudança e não sabe onde está. O que faria um companheiro atento e sensível? O mínimo para que ela se sentisse amparada e segura.

É verdade que não dá para saber como se relaciona um casal entre quatro paredes, mas o que fica é a forma como se tratam em público. E a mensagem que o casal Trump nos manda não é de um relacionamento harmonioso, mas de uma relação em que o homem manda e a mulher obedece, quando não é simplesmente tratada como algo obsoleto.

Melania disse, numa entrevista, que em 20 anos ela e Trump jamais discutiram. Veja, ou isso é uma tremenda mentira ou só prova que apenas uma voz, uma vontade e uma personalidade fala pelos dois. Casais brigam, porque nem sempre pensam da mesma forma e esses confrontos são necessários em qualquer relacionamento saudável.

Se, de fato, o casal Trump não se desentende, o que Melania confirma é que raramente contraria ou confronta um sujeito que já mostrou o quanto é machista, controlador, dono da verdade e que não se importa com a opinião de ninguém, inclusive a dela.

Melania é apontada por muita gente como uma legítima “trophy wife”. É possível que seja e tenha consciência dessa escolha, que é legítima. Cada mulher deve poder escolher o que acha melhor para si.

Há no mundo dezenas de milhares de aspirantes a Melania e elas parecem dispostas a pagar o preço por uma vida financeiramente confortável, mas sentimentalmente pobre. Haja Rivotril e alta costura para lidar com falta de atenção, de cordialidade, de companheirismo, de educação, e o que dizer de carinho? Mas é uma escolha.

Obviamente esse tipo de barganha não se resume a dinheiro e poder. Há milhares de mulheres profissionalmente e financeiramente independentes, mas reféns das migalhas de atenção em relacionamentos doentes. A maioria de nós já viveu isso.

Nos vendemos por um tequinho de atenção e alguns tantos orgasmos. Não precisamos de um cartão de crédito sem limites, mas estamos prontas a rastejar por um afago.

Em troca de conforto financeiro ou sentimental aceitamos falta de carinho, de amor, de atenção, de respeito. Aceitamos grosserias, violência emocional, machismo. Achamos natural que o cara não divida tarefas domésticas ou a responsabilidade da criação dos filhos. Engolimos traições.

Acreditamos que a nossa profissão, nossa vida e nossas prioridades sejam secundárias. Abaixamos a voz, vivemos na sombra, andamos atrás e nunca ao lado. E somos profundamente infelizes, morando na favela, num apartamento de classe média ou na Casa Branca. Porque escolhemos mal, porque namoramos, transamos, casamos com homens como Trump, seja por dinheiro ou pela ilusão do amor.

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