torcida

Por CAROLINE FERREIRA*

Certa vez, em uma mesa cheia de amigos, fui criticada por PODER discursar sobre determinado tema. “Você só gosta de futebol por causa dos jogadores bonitos!”; “Você é mulher, não entende nada”. As frases são muitas, cada uma com seu ponto de vista e todas com uma característica em comum: o preconceito. Me calei por uns minutos. Deixo de ser mulher e feminina quando passo a gostar de futebol? Acho que não. Minha resposta? Cair na gargalhada!

A outra disse “Crescemos ouvindo que futebol é coisa para homem. Fazer ballet, chorar sem motivo e comprar sapatos ou bolsas seriam coisas para uma mulher. Pensei “Fui criada ouvindo –faça o que quiser-. Tem alguma coisa errada aí. ”.

Aristóteles, baluarte do conhecimento filosófico e letrado que era em assuntos do coração já dizia: “case com uma mulher que reconheça um impedimento no jogo de futebol”.

Experimente dizer que não quer ir ao cinema na sessão de domingo às 17hs porque tem jogo.

Experimente falar, em uma quinta-feira, que vai ao estádio, como muitas vezes fiz, indo sozinha.

Experimente deixar a TV no VT de Flamengo e Chapecoense ou nos gols do XV de Piracicaba no Mogi Mirim, enquanto pinta a unha do pé, e alguém entrar no seu quarto.

Experimente deixar alguém entrar no seu carro no fim da tarde e te flagrar ouvindo Papo de Craque, segunda edição.

Experimente, ao ver um gol bonito, brincar que esse aí devia ser lance Lukscolor.

Experimente mencionar, com alguma naturalidade, nomes como Dínamo de Kiev, Borussia Dortmund ou Gamba Osaka.

Experimente mencionar um jogo qualquer da Champions que aconteceu há uns 3 anos.

Enfim. Experimente dizer o que qualquer Zé Mané pode dizer numa roda de amigos, mas, se for você, moça, só pode ser armação ou golpe de sorte. Ninguém vai se conformar que você saiba quem está na final da Copa do Brasil, nas semifinais da Sul-Americana e nas pontas da tabela do Brasileirão. E ainda poderão duvidar de sua sexualidade.

Ninguém está pronto para te ouvir falar de técnicos que superem o circuito Felipão-Dunga-Muricy-Mano Menezes. E nem precisa ousar muito. É só mencionar Ney Franco, Oswaldo de Oliveira, Cuca, Vagner Mancini, Abel Braga. Pronto, já é o caos, você é um alienígena.

Quem sabe? Afinal, Vander Lee já cantava:

“Ela finge que não, mas no seu coração

ainda sou artilheiro.

Só faz isso porque, meu irmão,

eu sou Galo e ela é Cruzeiro.”

Em uma lógica heteronormativa, a prática de esportes torna a mulher mais atraente porque ela passa a manipular um campo historicamente masculino. E tudo o que pertence ao campo semântico masculino é visto como positivo. Porém, gostar de esportes, no caso, o futebol, não me faz uma mulher melhor que as outras. Além disso, questionar e desqualificar a presença de uma mulher no estádio com o argumento “torcedora de verdade versus torcedora de mentira” é afirmar que só gostamos de futebol por motivos de homem. Por favor, vamos parar de acreditar nesse grande ícone do folclore machista futebolístico que é achar mulheres estrategicamente condicionam os gostos e predileções para encontrar um par? Combinados? Ótimo.

Outro totem dessa cultura masculinista que precisa ser derrubado é acreditar que nosso entendimento sobre futebol passa por saber ou não a regra do impedimento. É claro que os códigos que organizam os jogos são de suma importância, bem como saber a escalação completa do Piraporinha de 1973 é atributo importante para a construção do imaginário identitário do clube e dos seus torcedores, mas isso em nada me autoriza ou descredita o meu apreço pelo esporte.

Se a maioria dos fiscais do movimento “de quem é torcedor de verdade” usasse metade dessa energia para ler autoras e autores incríveis, perceberiam que SABER e CONHECER um esporte ultrapassa largamente o factual (saldo de gols, escalação de times, etc.).

Dito isto, parafraseando uma amiga:

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Futebol não é coisa de homem. Maternidade não é coisa de mulher. Tudo é de quem quer.

*CAROLINE é leitora deste blog, apaixonada por futebol

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